terça-feira, 24 de abril de 2012

Foundation's Edge

Isaac Asimov (1991). Foundation's Edge. Nova Iorque: Bantam Books.

Este é um livro curioso na série Fundação, originalmente publicado em 1982. Termina quase da mesma forma como se inicia, revê alguns dos pressupostos fundamentais da série e é um romance. Os primeiros livros da série contavam as histórias da Fundação através de contos longos. Este quarto volume quebra essa formalidade e avança com uma narrativa longa, complexa e centrada num só arco de acontecimentos.

Uma das coisas que observei ao longo da série foi uma visão algo draconiana da forma como Asimov via a necessidade de liderança das sociedades, com uma noção de progresso através das acções de líderes esclarecidos que vêem para lá das necessidades contemporâneas expressas. Subjacente está a crença na ciência como algo acima da visão dos indivíduos comuns e uma ideia de poder alicerçada numa certa bonomia ditatorial. Outro pormenor é a sujeição dos indivíduos às grandes forças que modelam o curso do devir histórico. Neste romance, surpreendentemente, é o contrário que é defendido. As lideranças utópicas são expostas como demasiado agarradas a necessidades mesquinhas e os momentos decisivos são deixados nas mãos de indivíduos que estão fora das correntes de pensamento.

Foundation's Edge leva mais longe a história das duas fundações que funcionam como o repositório da luz do conhecimento numa galáxia após a queda do império que a unificara. Asimov coloca o que são essencialmente duas faces de uma mesma moeda em confronto directo. Apercebemo-nos que a ciência tecnológica e a ciência psicológica das duas Fundações se complementam, mas essa visão escapa aos intervenientes. O confronto torna-se inevitável e até desejável pelas lideranças, mas um terceiro factor entra em jogo.

Os conflitos entre as duas fundações, um jogo de gato e rato de manobras secretas, levam duas personagens a vaguear pela galáxia ostensivamente em busca do elusivo berço primordial da humanidade, o esquecido e de localização ignorada planeta Terra. Encontram, ou mais precisamente são levados a encontrar, aquilo que de facto é uma terceira via na evolução da galáxia. Em busca do planeta original deparam-se com o mistério de um planeta consciente.

Em oposição à frieza científica das Fundações Asimov leva-nos até à harmonia natural de Gaia, planeta vivo onde todos os seres se encontram em sintonia e fazem parte de uma consciência colectiva embora mantenham a sua individualidade. Misturando um pouco das suas séries sobre robots com o universo de Fundação, Gaia é um artefacto que sugere a mistura de inteligência artificial avançada com uma visão hippie da humanidade em comunhão com a natureza. Chega até a propor-nos a ideia de um refúgio seguro para humanos construído por robots, que deixa no ar mais como mito criador do que componente da narrativa.

O duplo confronto altera-se com este terceiro elemento. A decisão da obra está na escolha de uma de três vias hegemónicas: o militarismo da Fundação tecnológica, a ditadura benevolente da Fundação psicológica, ou uma utopia evolucionária assente na expansão das consciências planetárias até a própria galáxia atingir a consciência. E é aqui que o livro termina quase como começou. Após a decisão, quase todos os intervenientes se afastam sem se recordarem dos acontecimentos marcantes. As duas fundações continuam os seus percursos olvidadas uma da outra. A forma como Asimov cria conspirações dentro de conspirações, jogos duplos e diferentes camadas é uma das marcas da série. Quanto ao destino final da galáxia, é sugerido que está dependente da resolução do mistério da localização do berço primordial da humanidade.

Obra intrigante, Foundation's Edge tira o tapete ao leitor e altera as expectativas sobre a série. O próximo passo é ver o que o autor nos reserva na busca pelo ponto inicial da expansão humana pela galáxia mítica. A revisitação de Decline and Fall of the Roman Empire já se encontra ultrapassada e Asimov encarreira-nos para um certo arthurianismo onde o planeta Terra funciona como um graal cósmico, cuja demanda molda os destinos dos personagens.