quinta-feira, 5 de novembro de 2015

Amadora BD 2015


Devo dizer que ao alterar a disposição de sempre do festival o Amadora BD assumiu o seu principal interesse para os fãs e conhecedores de banda desenhada. Centrar na entrada a área de autógrafos e livrarias foi uma ideia excelente, se bem que perigosa para a carteira. Por outro lado, secundarizou por completo a exposição-âncora desta edição do festival. Seria interessante que o evento se assumisse mais como feira de livro de banda desenhada, uma vez que nas exposições já nos habituou a uma continuidade monótona de grande exposição-âncora com tema pensado para agradar às escolas, que são o verdadeiro público do festival, seguida de instalações sobre alguns autores e álbuns editados.

A sensação que tive este ano, para além de ardor na carteira, foi que estaria a ver uma continuação do festival do ano passado. Claramente reciclaram muitos dos adereços do ano anterior, algo especialmente notável na exposição dedicada ao ano editorial, se é que podemos apelidar de "exposição" a livros agrafados a paletes de madeira. Aquilo não teve piada da primeira vez, e relegado para a cave - parque de estacionamento ainda fica com um aspecto mais deprimente.



Encolhi os ombros face à exposição central, A Criança na BD. Boa desculpa para desempoeirar personagens antigos, alguns conhecidos e outros completamente esquecidos, é uma exposição eminentemente pedagógica. Faz parte da tradição deste festival centrar-se em exposições viradas quer para o público que é leitor casual de BD ou para as escolas, cujas visitas de estudo certamente fornecem a maior parte do número de visitas ao festival (escrevo com conhecimento de causa, já participei na organização de algumas). O relembrar de personagens icónicas tem sempre algum interesse, mas não resisto à refilice: a única forma que podem colocar Stuart Carvalhais a ombrear com Winsor McKay é mesmo porque ambos criaram personagens infantis. É algo patético tentar enquadrar um autor português cuja qualidade advém apenas da sua importância histórica com os talentos mais vincados dos grandes desenhadores. Não que a ideia de recuperar Carvalhais seja má. Pelo contrário, um dos bons aspectos do festival é a forma como pode preservar a história da banda desenhada portuguesa.



Das restantes exposições, destacaria as dedicadas à Zona de Desconforto, As Serpentes de Água e 30 Anos de Tertúlia de Banda Desenhada. Estou curioso com a dedicada a Tardi, mas que sendo fora do espaço do Amadora BD, ainda não visitei.

Como é habitual, o Amadora BD é vítima do seu sucesso. Não deixa de ser um espaço que reúne criadores e leitores, coloca a BD no mapa cultural, é uma oportunidade para enriquecer as estantes e vai caminhando na linha ténue entre evento para a comunidade de banda desenhada e festival camarário obrigado a cumprir os requisitos da política local. Esperamos sempre dele algo de novo e fascinante, mas dá-nos sempre mais do mesmo. Mofento, li por aí algures, e não discordo. Mas repete-se todos os anos, ritualista, e se não se repetisse o panorama cultural ficaria muito mais pobre.