sexta-feira, 11 de março de 2016

Tomorrowland

 
 Steven Kotler (2015). Tomorrowland: Our Staggering Journey from Science Fiction to Science Fact. Amazon Publishing.

Seria preciso mais do que uma colecção de artigos díspares sobre algumas tendências tecnológicas para, realmente, entrar no campo da procura pelo que um futuro mediado pela ciência e tecnologia nos trará. Tomorrowland não passa deste nível elementar, de colecção de artigos previamente editados em publicações de renome. Recordo-me de ter lido alguns na Wired.

Se há um fio condutor nesta obra que pretende guiar-nos pela vanguarda que constrói hoje o futuro, é o do histerismo optimista, conjugado com o culto de personalidade da figura do empreendedor com visão e algumas pitadas libertárias do velho discurso do efeito negativo das nefandas regulações estatais sobre aqueles pioneiros que, desinteressados apenas querem levar mais longe as possibilidades trazidas pelas novas tecnologias. Falta a este livro sentido crítico, o ir além de mero retrato de personalidades interessantes que desenvolvem trabalhos com o seu quê de radical.

Pensar desta forma é ignorar o papel fundamental da ciência, daquela menos sexy e mais cinzentona, vinda do mundo académico. Esquecer que leis e regulamentações podem parecer empecilhos mas são, também, protecções contra a predação exercida por pessoas sem escrúpulos ou para consequências antevistas do uso de tecnologias. Claro que as coisas são mais fluídas do que as habituais posições binárias, que de facto personalidades marcantes sabem fazer uso da investigação elementar para nos deslumbrar com serviços e produtos inovadores, ou que tem de haver adaptação das leis que regulamentam tecnologias à sua evolução. Mas notem, no caso do mito tão adorado nos dia de hoje do visionário capaz de mudar o mundo da tecnologia, que para cada Elon Musk ou Steve Jobs há algumas centenas de meros vendedores de banhas da cobra. E isto sem sequer entrar nas alegadas práticas laborais de Musk, ou na forma como a Apple explora mão de obra barata para vender produtos de luxo com taxas de lucro elevadas. Estaremos mesmo dispostos a esquecer estas questões em troca das visões de cromado reluzente de um futurismo tecnocrático?

Apesar deste livro nos trazer histórias interessantes sobre a vanguarda da tecnologia, e deixar algumas reflexões perceptíveis à luz das chamadas guerras culturais americanas, entre o conservadorismo que se socorre de todos os meios para levar em frente a sua agenda, este livro falha no essencial. Não consegue passar de mera colecção de artigos para, como pretende, ser um retrato plausível das tendências que irão modelar o futuro próximo.