quinta-feira, 27 de julho de 2017

Man:Plus



André Lima Araújo (2016). Man:Plus Electric Memory. Londres: Titan Comics.

Man:Plus veste muito bem e sem medo as suas referências. É um trabalho assumidamente derivativo, feito como homenagem ao cyberpunk clássico, ao mangá de FC e às séries policiais procedimentais. Não copia à sorrelfa elementos destes géneros, tentando passar-se por obra nova e inédita. A cópia é visível, intencional e assumida. Se a história é original, não tem medo de citar estilistica, temática e visualmente as influências que claramente fascinam André Araújo. Consigo ler este livro quer como aventura cyberpunk, no que é igual a tantas outras, mas o seu lado de homenagem, quase fan fiction de um fã conhecedor e talentoso, é o que desperta o interesse. Isso, e o estilo gráfico do autor, que já ouvi descrito como uma espécie de Shirow português.

Estamos num futuro próximo, na mega-cidade de Olissipo, não uma Lisboa futurista mas uma cidade nova, construída por um conglomerado chinês que vê nos territórios abandonados portugueses uma porta de entrada barata para a europa. Nas ruas da cidade surge um andróide em fuga, perseguido por temíveis mercenários ciber-aumentados. Uma unidade de investigação especial da polícia envolve-se, com agentes que também têm próteses cibernéticas e que não desdenham o submundo dos hackers para decifrar os mais avançados algoritmos. No cerne da narrativa, um cientista que fez o upload da mente da sua falecida mulher para o corpo de um andróide. O conflito entre a mente humana e a inteligência artificial provoca comportamentos anómalos num mecanismo que ultrapassa a condição de máquina, e o maior gestor do conglomerado faz tudo para capturar a andróide, em busca de novos produtos a mercantilizar.

Se estas linhas narrativas vos soam demasiado a Ghost In The Shell ou a Neuromancer, é porque o são. Os ingredientes estão lá todos, sublinhando este Man:Plus não como mais uma banal história cyberpunk, mas como uma homenagem conhecedora do género. Ciber-tecnologias, andróides conscientes que transcendem a fronteira entre o mecânico e a vida, intrigas nos corredores de mega-corporações que não olham a meios para assegurar lucros, a mistura high tech com decadência e a dose exagerada de fascínio oriental, todos os elementos do cozinhado cyberpunk são manipulados com gosto por André Araújo, com alguns retoques especiais, como a referência às séries televisivas de policial procedimental futurista (uma das personagens é uma referência directa à atriz americana Linda Hunt) e, no título, uma ligação a Man Plus de Frederik Pohl. Também se detectam laivos de Blade Runner (andróides avançados a ser usados no espaço exterior), e a referência estética ao mangá Cyberpunk, especialmente ao trabalho de Masamune Shirow, é omnipresente. Na fronteira entre obra de mérito próprio e fan fiction erudita, Man:Plus é uma declaração de amor ao cyberpunk, fantasticamente ilustrada.